sábado, 16 de junho de 2018

DIÁRIO DA COPA - DIA 3: O VAR aparece, Messi não.




FRANÇA 2 X 1 AUSTRÁLIA

Diferente do que as previsões diziam, a partida entre França e Austrália foi bem mais difícil do que o planejado. Treinada por Bert van Marvijk, vice-campeão com a Holanda em 2010, a seleção australiana entrou jogando um futebol defensivo, apostando em contra-ataques rápidos para tentar chegar ao gol francês. Do outro lado, um trator: a França amassou nos primeiros minutos de jogo, usando a absurda mobilidade de M’Bappé e a velocidade de Dembelè. Os dois atacantes foram incisivos o tempo inteiro, dando muito trabalho para os defensores australianos. Mas com o passar do tempo o jogo foi mudando, a Austrália começou a neutralizar o jogo francês, cortando as linhas de passe e ocupando os espaços em que M’Bappé e Griezmann cortavam em direção ao gol. Chegou um momento do jogo em que a França simplesmente não conseguia mais entrar, pois a Austrália colocava todos os seus jogadores na frente do gol. Com todas as portas fechadas, a França precisava de paciência e toque de bola para encontrar os eventuais espaços que qualquer equipe muito focada em defesa dá, mas a juventude e irritação da equipe acabaram motivando-os a forçarem passes difíceis, longos e ineficientes, além da exigência da inclusão dos defensores na criação de jogadas.
O grande diferencial desta equipe australiana para as outras equipes sem expressão é que neste caso temos uma equipe verdadeiramente bem treinada, com jogadores que não ficam atrás fisicamente dos europeus e, mais importante, reconhecem a sua inferioridade e entendem qual tipo de jogo deveriam utilizar para otimizar seus resultados. Foi assim, jogando de maneira consciente, que os australianos terminaram o primeiro tempo jogando melhor que os franceses, com duas chances de gol importantes: a primeira defendida milagrosamente por Lloris, a segunda desperdiçada em finalização de fora da área.
No segundo tempo o marasmo era o mesmo, mas agora com uma seleção australiana ainda mais agressiva, ao ponto de ter tomado totalmente o controle do jogo. A empolgação australiana, contudo, foi logo domada. Em rápida roubada de bola, a França encontrou Pogba livre no meio campo, com espaço para fazer o que bem entendesse. O meia avançou e deu um passe magistral para Griezmann. O atacante chegou na bola primeiro que o defensor, mas acabou sendo tocado e caiu no chão. O juiz não marcou nada na hora, a jogada seguiu, mas a equipe de vídeo solicitou que o lance fosse revisado. Foi a primeira ocasião do VAR na Copa, num momento que já entrou para a história dos mundiais. Com a marcação, a França enfim abriu o placar em ótima cobrança de Griezmann.


Poucos minutos depois a Austrália empatou, em lance bizarro de Umtiti, que disputou uma bola aérea com os braços levantados, tocando-a e causando mais um pênalti no jogo. Agora tomada pelo desespero de ter apenas 20 minutos para salvar a sua estreia, a França passou a agredir mais, ainda sem nenhuma eficiência. Não satisfeito com a pouca criação apresentada pela equipe, Deschamps, um dos piores técnicos que eu já vi na vida, tirou dois dos seus melhores jogadores, Griezmann e Dembelè, para colocar o sempre contestado Giroud e Nabil Fekir. Giroud ainda participou bem no gol de Pogba, mas pouco efeito causou além deste lance, enquanto Fekir quase não se fez sentir. O desempate, aliás, só saiu graças a uma ótima jogada de Pogba, que tabelou duas vezes antes de encobrir o goleiro australiano. O lance também causou alguma comoção, mas o árbitro marcou, graças a tecnologia da linha do gol, corretamente a favor da França.
A Austrália perdeu, mas pode sair satisfeita deste jogo. Foi um adversário duríssimo contra uma França gigantesca e talentosíssima, chegando a dominar o jogo em alguns momentos. Certamente fará jogo duro contra Peru e Dinamarca, com chances reais de classificação. Já a França deixou claro que vai sim se classificar, provavelmente como líder, mas que está bem longe de saber usar todo o potencial que este elenco tem.

ARGENTINA 1 X 1 ISLÂNDIA

Depois dos três gols de Cristiano Ronaldo no dia anterior, todos os olhos do mundo estavam sobre Messi: será que o craque argentino seria capaz de fazer uma atuação semelhante? De quanto que seria a goleada da equipe contra a fraca seleção islandesa? Bom, na verdade as coisas foram um pouco diferentes.
Depois de uma campanha histórica na Eurocopa de 2016, a Islândia chegou ao mundial com menos reconhecimento do que deveria. Além do bom futebol mostrado em 2016, gabaritavam a equipe para a competição a ótima campanha nas eliminatórias, onde se classificou em primeiro lugar, jogando a badalada Croácia para a repescagem. Os nomes da equipe são em sua maioria de jogadores que atuam em equipes médias da Inglaterra e de ligas menores da Europa, mas, com exceção de Gilfy Sigurdsson, nenhum é de fato um grande destaque em seu campeonato. Alguns bons jogadores que apareceram na Euro de 2016 foram negociados após a competição, mas não conseguiram demonstrar o mesmo nível de jogo no futebol de clubes. Isto serve muito bem para demonstrar a qualidade do projeto que hoje é tocado por Heimir Hallgrímsson, e antes capitaneado pelo lendário Lars Lagerback.


A Argentina tentou ser agressiva desde o começo do jogo. Tentando verticalizar o máximo possível já no começo, provavelmente prevendo que a defesa da Islândia ficaria muito mais dura após os momentos iniciais de jogo. Foi assim, sendo bem insistente no ataque que a equipe argentina abriu o placar com Aguero. Mas a vantagem quase não durou: quatro minutos depois a Islândia empatou em uma jogada desastrosa da defesa argentina. Sério, a bola cruzou a área do goleiro Cabellero por três vezes até que o bom centroavante Finnbógason conseguisse enfim fazer o gol. A defesa argentina demonstrou completa incapacidade em defender tanto pelo alto como pelo chão. Sálvio, improvisado na lateral direita, deu espaço para que o setor esquerdo do ataque islandês fizesse o que bem entendesse. Tagliafico também não conseguiu fazer diferença pelo lado esquerdo e os zagueiros foram um pesadelo a parte. É muito difícil entender o que acontece com Otamendi e Rojo, presentes em dois dos maiores clubes do mundo, mas que simplesmente parecem ser os piores zagueiros possíveis quando atuam pela Argentina. Meu palpite: a culpa é do Sampaoli. Além da má atuação dos jogadores de defesa, os volantes também foram inutilizados. Como quase todas as jogadas da Islândia aconteciam pelo lado, Mascherano e Biglia sempre pareciam estar em mais do que era necessário para essa contenção, mas até mesmo quando a equipe europeia começou a jogar por dentro os dois pareciam perdidos em campo.
Depois do gol a Argentina voltou a atacar de maneira insistente, mas aí encontrou O MURO islandês. Quem acompanhou os jogos da última Euro sabe muito bem que o estilo de jogo da Islândia é bem simples: fecha todo mundo na defesa, obriga o adversário a avançar os defensores e corre como maluco para conseguir achar um contra-ataque. É desesperador assistir, parece chato, mas acompanhar o esforço e a dedicação dos jogadores é algo que chega a emocionar. A imagem do volante e capitão Gunnarson sendo substituído já é uma das melhores imagens da Copa. A defesa da Islândia foi espetacular quase em todo o jogo, fazendo o que era possível para parar Messi os atacantes da Argentina, mas é necessário registrar também a dificuldade apresentada por Aguero e Di María na partida, totalmente apagados no jogo após o gol da equipe. Em uma das únicas falhas defensivas, no caso uma falha individual, a Argentina conseguiu achar um pênalti, mas a oportunidade foi desperdiçada por Messi, que bateu nas mãos do goleiro Halldórsson. Foi basicamente assim que a partida acabou, com muita comemoração por parte da Islândia e um claro sentimento de preocupação e decepção pelo lado da Argentina.


A equipe de Messi precisa se reestabelecer e encontrar outras formas de produzir no ataque que não envolvam a grande estrela. Dybala não pode ser reserva desta equipe, especialmente com Di María jogando tão mal. E mais importante: Lionel Messi como meia armador é um grande desperdício de talento, afinal ele rende muito mais quando joga caindo pela esquerda, ou mesmo como um comandante de ataque. Se não corrigir os múltiplos defeitos escancarados na partida de hoje a seleção argentina pode ficar realmente preocupada, pois nada garante que eles conseguirão se classificar em um grupo tão difícil. Já a Islândia, bem, o pior já foi, e eles sobreviveram muito bem. O que vier agora é lucro.

PERU 0 X 1 DINAMARCA

Essa Copa do Mundo tem tido como grande característica a persistência do jogo defensivo, com algumas equipes mais preocupadas em não tomar gol do que em fazer. Estamos vendo alguns placares baixos, muita gente dentro da área defensiva e pouca correria. Com os espaços cada vez menores, muitos preferem usar o chuveirinho, arriscar de fora ou criar alguma coisa pelos lados do campo. Ontem tivemos apenas um jogo que destoou disto, a ótima partida entre Portugal e Espanha, e hoje tivemos Peru e Dinamarca. Ainda que o placar não demonstre, nunca parece que um 1x0 é um grande jogo, a partida já está entre as melhores desta edição.
Sem a sua estrela principal, Paolo Guerrero, a seleção peruana entrou com vontade de mostrar que ia muito além de seu centroavante titular. Com Farfán improvisado no comando de ataque a equipe ganhou em velocidade e verticalização, sendo uma estratégia regular as enfiadas de bola para o camisa 10. Esta postura, contudo, não fez com que a Dinamarca ficasse presa na defesa. Muito pelo contrário, a equipe decidiu que a melhor forma de conter a incisividade do adversário era justamente controlar a bola. Como diz o princípio básico do futebol moderno, quando você tem a posse de bola (e preserva bem ela) você já tem a garantia de que não levará gols, ficando a sua capacidade marcar ou não um. A Dinamarca então começou a controlar o jogo, com o Peru pressionando a saída de bola nos momentos iniciais. Depois de algum tempo, a pressão da seleção sul-americana foi diminuindo, muito pelo cansaço que este tipo de jogo causa (ainda mais quando o jogador que lidera essa pressão, Farfán, é um idoso). A Dinamarca cresceu, deixando o jogo mais aberto para ambas as equipes. Sem grandes chances criadas, mas com uma boa trocação de ataques, o jogo só foi reencontrar um momento de atenção quando Cueva foi derrubado na área e o árbitro, com ajuda do VAR, marcou pênalti contra a equipe dinamarquesa. Na cobrança o jogador do São Paulo isolou.
O segundo tempo foi muito mais aberto, com muitas jogadas sendo criadas por ambas as equipes. Lembra daquela história de que a Copa estava mais lenta? Pois bem, aqui a correria comeu solta, com contra-ataques de contra-ataques acontecendo o tempo todo. Não que estas jogadas sempre fossem bem realizadas, mas a agitação foi suficiente para empolgar o torcedor. Contudo, esta loucura toda não tinha um dono, com nenhuma das duas equipes ditando o ritmo do jogo, até que, em uma rara falha dos volantes do Peru, Eriksen pegou a bola sozinho no meio campo e achou Poulsen livre para abrir o placar. A partir daí o Peru começou a bombardear. Guerrero saiu do banco e pareceu dar uma nova injeção de ânimo para seus companheiros. Cueva, Carrillo e Advíncula passaram a jogar melhor e a referência do centroavante na grande área desorganizou demais a defesa dinamarquesa. Mas a seleção europeia não ficou apenas olhando: com muito espaço para jogar atrás dos zagueiros peruanos, toda bola roubada pela Dinamarca virou um rápido contra-ataque, tendo a equipe umas três ou quatro chances de matar o jogo. Então não valeu a pena para o Peru adotar tal postura? Bem, na verdade valeu sim, e muito. A equipe de Guerrero só não empatou porque viu ótimas intervenções de Schmeichel (melhor jogador em campo), um corte providencial de Poulsen em uma bola para Guerrero e a bola raspar a trave após um chute com o calcanhar de Guerrero.


Ainda que não seja o resultado esperado, a seleção peruana não deveria ficar insatisfeita com a performance de hoje. A equipe criou, jogou bem e só foi vazada graças a uma falha de defesa, o que quase não se repetiu durante todo o jogo. Com Guerreiro titular esta equipe parece ser muito forte, fazendo frente a qualquer outra desta competição. Se a Austrália, com um time mais fraco, já conseguiu complicar a vida da França, não me surpreenderia se o Peru roubasse pontos do outro europeu de seu grupo. Já a Dinamarca vai voltar muito satisfeita com seus três pontinhos, podendo jogar com mais tranquilidade contra Peru e França e, por que não, sonhar até com uma liderança no grupo.

NIGÉRIA 0 X 2 CROÁCIA

O último jogo do dia foi bem menos interessante do que esperávamos. Após um bom primeiro tempo, com algumas trocas nos ataques entre as duas equipes, a segunda etapa se caracterizou pela inconsistência das duas equipes. Após o segundo gol croata, marcado de pênalti (repararam que nos quatro jogos tivemos pênaltis?) por Luka Modric, as duas equipes pareceram abandonar o jogo. Desta forma temos pouco a dizer sobre a partida, mas vamos lá.
A equipe nigeriana, conhecida pela força e por alguns bons nomes no setor ofensivo, não conseguiu se impor durante a partida. Obi Mikel ainda é um mistério: a gente sempre ouve falar bem dele, mas quando colocamos nossos olhos para vê-lo atuando nunca temos uma boa impressão. Faltou criatividade e armação ao time, que insistiu de maneira estúpida nos contra-ataques e ligações diretas para Moses. O meia direita, aliás, demonstrou estar muito mais preocupado em cavar faltas e se jogar, desistindo de jogadas que podiam geral bons ataques. A defesa falhou, mas não é tão ruim assim, pode até segurar bons ataques se estiver com confiança, mas essa confiança só virá de fato caso o ataque consiga criar chances e desafogar o pessoal de trás. Não vejo muita chance para essa equipe nesta edição da Copa, mas certamente não é o caso de jogar tudo para o alto, eles são jovens e um trabalho a longo prazo pode significar melhoras nas próximas edições do mundial.


Já os croatas, bem, lembraram muito a equipe que jogou a Euro em 2016. Com um ataque robusto e presente de quatro jogadores os croatas tornam-se uma potência ofensiva. Não que eles sejam todos talentosíssimos, mas a superpopulação contra defesas que falham (como a da Argentina) pode ser o básico para criar caos e confusão no futuro da competição. E o que garante este esquema ainda é a incrível solidez defensiva da equipe, com uma linha defensiva muito bem postada que simplesmente anulou o badalado ataque dos nigerianos. Acredito que a equipe sobrará contra a Argentina, ainda que os sul-americanos venham de fato mordidos para o jogo. Minha aposta nesse momento é que eles passem como primeiro do grupo, com alguma facilidade, aliás.

Nenhum comentário:

Postar um comentário