FRANÇA 2 X 1 AUSTRÁLIA
Diferente
do que as previsões diziam, a partida entre França e Austrália foi bem mais
difícil do que o planejado. Treinada por Bert van Marvijk, vice-campeão com a
Holanda em 2010, a seleção australiana entrou jogando um futebol defensivo,
apostando em contra-ataques rápidos para tentar chegar ao gol francês. Do outro
lado, um trator: a França amassou nos primeiros minutos de jogo, usando a
absurda mobilidade de M’Bappé e a velocidade de Dembelè. Os dois atacantes
foram incisivos o tempo inteiro, dando muito trabalho para os defensores
australianos. Mas com o passar do tempo o jogo foi mudando, a Austrália começou
a neutralizar o jogo francês, cortando as linhas de passe e ocupando os espaços
em que M’Bappé e Griezmann cortavam em direção ao gol. Chegou um momento do
jogo em que a França simplesmente não conseguia mais entrar, pois a Austrália
colocava todos os seus jogadores na frente do gol. Com todas as portas
fechadas, a França precisava de paciência e toque de bola para encontrar os
eventuais espaços que qualquer equipe muito focada em defesa dá, mas a
juventude e irritação da equipe acabaram motivando-os a forçarem passes
difíceis, longos e ineficientes, além da exigência da inclusão dos defensores
na criação de jogadas.
O
grande diferencial desta equipe australiana para as outras equipes sem
expressão é que neste caso temos uma equipe verdadeiramente bem treinada, com
jogadores que não ficam atrás fisicamente dos europeus e, mais importante,
reconhecem a sua inferioridade e entendem qual tipo de jogo deveriam utilizar
para otimizar seus resultados. Foi assim, jogando de maneira consciente, que os
australianos terminaram o primeiro tempo jogando melhor que os franceses, com
duas chances de gol importantes: a primeira defendida milagrosamente por Lloris,
a segunda desperdiçada em finalização de fora da área.
No
segundo tempo o marasmo era o mesmo, mas agora com uma seleção australiana
ainda mais agressiva, ao ponto de ter tomado totalmente o controle do jogo. A
empolgação australiana, contudo, foi logo domada. Em rápida roubada de bola, a
França encontrou Pogba livre no meio campo, com espaço para fazer o que bem
entendesse. O meia avançou e deu um passe magistral para Griezmann. O atacante
chegou na bola primeiro que o defensor, mas acabou sendo tocado e caiu no chão.
O juiz não marcou nada na hora, a jogada seguiu, mas a equipe de vídeo
solicitou que o lance fosse revisado. Foi a primeira ocasião do VAR na Copa,
num momento que já entrou para a história dos mundiais. Com a marcação, a
França enfim abriu o placar em ótima cobrança de Griezmann.
Poucos
minutos depois a Austrália empatou, em lance bizarro de Umtiti, que disputou
uma bola aérea com os braços levantados, tocando-a e causando mais um pênalti
no jogo. Agora tomada pelo desespero de ter apenas 20 minutos para salvar a sua
estreia, a França passou a agredir mais, ainda sem nenhuma eficiência. Não
satisfeito com a pouca criação apresentada pela equipe, Deschamps, um dos
piores técnicos que eu já vi na vida, tirou dois dos seus melhores jogadores,
Griezmann e Dembelè, para colocar o sempre contestado Giroud e Nabil Fekir.
Giroud ainda participou bem no gol de Pogba, mas pouco efeito causou além deste
lance, enquanto Fekir quase não se fez sentir. O desempate, aliás, só saiu
graças a uma ótima jogada de Pogba, que tabelou duas vezes antes de encobrir o
goleiro australiano. O lance também causou alguma comoção, mas o árbitro
marcou, graças a tecnologia da linha do gol, corretamente a favor da França.
A
Austrália perdeu, mas pode sair satisfeita deste jogo. Foi um adversário
duríssimo contra uma França gigantesca e talentosíssima, chegando a dominar o
jogo em alguns momentos. Certamente fará jogo duro contra Peru e Dinamarca, com
chances reais de classificação. Já a França deixou claro que vai sim se
classificar, provavelmente como líder, mas que está bem longe de saber usar
todo o potencial que este elenco tem.
ARGENTINA 1 X 1 ISLÂNDIA
Depois
dos três gols de Cristiano Ronaldo no dia anterior, todos os olhos do mundo
estavam sobre Messi: será que o craque argentino seria capaz de fazer uma
atuação semelhante? De quanto que seria a goleada da equipe contra a fraca
seleção islandesa? Bom, na verdade as coisas foram um pouco diferentes.
Depois
de uma campanha histórica na Eurocopa de 2016, a Islândia chegou ao mundial com
menos reconhecimento do que deveria. Além do bom futebol mostrado em 2016,
gabaritavam a equipe para a competição a ótima campanha nas eliminatórias, onde
se classificou em primeiro lugar, jogando a badalada Croácia para a repescagem.
Os nomes da equipe são em sua maioria de jogadores que atuam em equipes médias
da Inglaterra e de ligas menores da Europa, mas, com exceção de Gilfy
Sigurdsson, nenhum é de fato um grande destaque em seu campeonato. Alguns bons
jogadores que apareceram na Euro de 2016 foram negociados após a competição,
mas não conseguiram demonstrar o mesmo nível de jogo no futebol de clubes. Isto
serve muito bem para demonstrar a qualidade do projeto que hoje é tocado por Heimir
Hallgrímsson, e antes capitaneado pelo lendário Lars Lagerback.
A
Argentina tentou ser agressiva desde o começo do jogo. Tentando verticalizar o
máximo possível já no começo, provavelmente prevendo que a defesa da Islândia
ficaria muito mais dura após os momentos iniciais de jogo. Foi assim, sendo bem
insistente no ataque que a equipe argentina abriu o placar com Aguero. Mas a
vantagem quase não durou: quatro minutos depois a Islândia empatou em uma
jogada desastrosa da defesa argentina. Sério, a bola cruzou a área do goleiro
Cabellero por três vezes até que o bom centroavante Finnbógason conseguisse
enfim fazer o gol. A defesa argentina demonstrou completa incapacidade em
defender tanto pelo alto como pelo chão. Sálvio, improvisado na lateral
direita, deu espaço para que o setor esquerdo do ataque islandês fizesse o que
bem entendesse. Tagliafico também não conseguiu fazer diferença pelo lado
esquerdo e os zagueiros foram um pesadelo a parte. É muito difícil entender o
que acontece com Otamendi e Rojo, presentes em dois dos maiores clubes do
mundo, mas que simplesmente parecem ser os piores zagueiros possíveis quando
atuam pela Argentina. Meu palpite: a culpa é do Sampaoli. Além da má atuação
dos jogadores de defesa, os volantes também foram inutilizados. Como quase
todas as jogadas da Islândia aconteciam pelo lado, Mascherano e Biglia sempre
pareciam estar em mais do que era necessário para essa contenção, mas até mesmo
quando a equipe europeia começou a jogar por dentro os dois pareciam perdidos
em campo.
Depois
do gol a Argentina voltou a atacar de maneira insistente, mas aí encontrou O
MURO islandês. Quem acompanhou os jogos da última Euro sabe muito bem que o
estilo de jogo da Islândia é bem simples: fecha todo mundo na defesa, obriga o
adversário a avançar os defensores e corre como maluco para conseguir achar um
contra-ataque. É desesperador assistir, parece chato, mas acompanhar o esforço
e a dedicação dos jogadores é algo que chega a emocionar. A imagem do volante e
capitão Gunnarson sendo substituído já é uma das melhores imagens da Copa. A
defesa da Islândia foi espetacular quase em todo o jogo, fazendo o que era
possível para parar Messi os atacantes da Argentina, mas é necessário registrar
também a dificuldade apresentada por Aguero e Di María na partida, totalmente
apagados no jogo após o gol da equipe. Em uma das únicas falhas defensivas, no
caso uma falha individual, a Argentina conseguiu achar um pênalti, mas a
oportunidade foi desperdiçada por Messi, que bateu nas mãos do goleiro
Halldórsson. Foi basicamente assim que a partida acabou, com muita comemoração
por parte da Islândia e um claro sentimento de preocupação e decepção pelo lado
da Argentina.
A
equipe de Messi precisa se reestabelecer e encontrar outras formas de produzir
no ataque que não envolvam a grande estrela. Dybala não pode ser reserva desta
equipe, especialmente com Di María jogando tão mal. E mais importante: Lionel
Messi como meia armador é um grande desperdício de talento, afinal ele rende
muito mais quando joga caindo pela esquerda, ou mesmo como um comandante de
ataque. Se não corrigir os múltiplos defeitos escancarados na partida de hoje a
seleção argentina pode ficar realmente preocupada, pois nada garante que eles
conseguirão se classificar em um grupo tão difícil. Já a Islândia, bem, o pior
já foi, e eles sobreviveram muito bem. O que vier agora é lucro.
PERU 0 X 1 DINAMARCA
Essa
Copa do Mundo tem tido como grande característica a persistência do jogo
defensivo, com algumas equipes mais preocupadas em não tomar gol do que em
fazer. Estamos vendo alguns placares baixos, muita gente dentro da área
defensiva e pouca correria. Com os espaços cada vez menores, muitos preferem
usar o chuveirinho, arriscar de fora ou criar alguma coisa pelos lados do
campo. Ontem tivemos apenas um jogo que destoou disto, a ótima partida entre
Portugal e Espanha, e hoje tivemos Peru e Dinamarca. Ainda que o placar não
demonstre, nunca parece que um 1x0 é um grande jogo, a partida já está entre as
melhores desta edição.
Sem
a sua estrela principal, Paolo Guerrero, a seleção peruana entrou com vontade
de mostrar que ia muito além de seu centroavante titular. Com Farfán
improvisado no comando de ataque a equipe ganhou em velocidade e
verticalização, sendo uma estratégia regular as enfiadas de bola para o camisa
10. Esta postura, contudo, não fez com que a Dinamarca ficasse presa na defesa.
Muito pelo contrário, a equipe decidiu que a melhor forma de conter a
incisividade do adversário era justamente controlar a bola. Como diz o
princípio básico do futebol moderno, quando você tem a posse de bola (e
preserva bem ela) você já tem a garantia de que não levará gols, ficando a sua
capacidade marcar ou não um. A Dinamarca então começou a controlar o jogo, com
o Peru pressionando a saída de bola nos momentos iniciais. Depois de algum
tempo, a pressão da seleção sul-americana foi diminuindo, muito pelo cansaço que
este tipo de jogo causa (ainda mais quando o jogador que lidera essa pressão,
Farfán, é um idoso). A Dinamarca cresceu, deixando o jogo mais aberto para
ambas as equipes. Sem grandes chances criadas, mas com uma boa trocação de
ataques, o jogo só foi reencontrar um momento de atenção quando Cueva foi
derrubado na área e o árbitro, com ajuda do VAR, marcou pênalti contra a equipe
dinamarquesa. Na cobrança o jogador do São Paulo isolou.
O
segundo tempo foi muito mais aberto, com muitas jogadas sendo criadas por ambas
as equipes. Lembra daquela história de que a Copa estava mais lenta? Pois bem,
aqui a correria comeu solta, com contra-ataques de contra-ataques acontecendo o
tempo todo. Não que estas jogadas sempre fossem bem realizadas, mas a agitação
foi suficiente para empolgar o torcedor. Contudo, esta loucura toda não tinha
um dono, com nenhuma das duas equipes ditando o ritmo do jogo, até que, em uma
rara falha dos volantes do Peru, Eriksen pegou a bola sozinho no meio campo e
achou Poulsen livre para abrir o placar. A partir daí o Peru começou a
bombardear. Guerrero saiu do banco e pareceu dar uma nova injeção de ânimo para
seus companheiros. Cueva, Carrillo e Advíncula passaram a jogar melhor e a
referência do centroavante na grande área desorganizou demais a defesa dinamarquesa.
Mas a seleção europeia não ficou apenas olhando: com muito espaço para jogar
atrás dos zagueiros peruanos, toda bola roubada pela Dinamarca virou um rápido
contra-ataque, tendo a equipe umas três ou quatro chances de matar o jogo.
Então não valeu a pena para o Peru adotar tal postura? Bem, na verdade valeu
sim, e muito. A equipe de Guerrero só não empatou porque viu ótimas
intervenções de Schmeichel (melhor jogador em campo), um corte providencial de
Poulsen em uma bola para Guerrero e a bola raspar a trave após um chute com o calcanhar de Guerrero.
Ainda
que não seja o resultado esperado, a seleção peruana não deveria ficar
insatisfeita com a performance de hoje. A equipe criou, jogou bem e só foi
vazada graças a uma falha de defesa, o que quase não se repetiu durante todo o
jogo. Com Guerreiro titular esta equipe parece ser muito forte, fazendo frente
a qualquer outra desta competição. Se a Austrália, com um time mais fraco, já
conseguiu complicar a vida da França, não me surpreenderia se o Peru roubasse
pontos do outro europeu de seu grupo. Já a Dinamarca vai voltar muito
satisfeita com seus três pontinhos, podendo jogar com mais tranquilidade contra
Peru e França e, por que não, sonhar até com uma liderança no grupo.
NIGÉRIA 0 X 2 CROÁCIA
O
último jogo do dia foi bem menos interessante do que esperávamos. Após um bom
primeiro tempo, com algumas trocas nos ataques entre as duas equipes, a segunda
etapa se caracterizou pela inconsistência das duas equipes. Após o segundo gol
croata, marcado de pênalti (repararam que nos quatro jogos tivemos pênaltis?)
por Luka Modric, as duas equipes pareceram abandonar o jogo. Desta forma temos
pouco a dizer sobre a partida, mas vamos lá.
A
equipe nigeriana, conhecida pela força e por alguns bons nomes no setor
ofensivo, não conseguiu se impor durante a partida. Obi Mikel ainda é um
mistério: a gente sempre ouve falar bem dele, mas quando colocamos nossos olhos
para vê-lo atuando nunca temos uma boa impressão. Faltou criatividade e armação
ao time, que insistiu de maneira estúpida nos contra-ataques e ligações diretas
para Moses. O meia direita, aliás, demonstrou estar muito mais preocupado em
cavar faltas e se jogar, desistindo de jogadas que podiam geral bons ataques. A
defesa falhou, mas não é tão ruim assim, pode até segurar bons ataques se
estiver com confiança, mas essa confiança só virá de fato caso o ataque consiga
criar chances e desafogar o pessoal de trás. Não vejo muita chance para essa
equipe nesta edição da Copa, mas certamente não é o caso de jogar tudo para o
alto, eles são jovens e um trabalho a longo prazo pode significar melhoras nas
próximas edições do mundial.
Já
os croatas, bem, lembraram muito a equipe que jogou a Euro em 2016. Com um
ataque robusto e presente de quatro jogadores os croatas tornam-se uma potência
ofensiva. Não que eles sejam todos talentosíssimos, mas a superpopulação contra
defesas que falham (como a da Argentina) pode ser o básico para criar caos e
confusão no futuro da competição. E o que garante este esquema ainda é a
incrível solidez defensiva da equipe, com uma linha defensiva muito bem postada
que simplesmente anulou o badalado ataque dos nigerianos. Acredito que a equipe
sobrará contra a Argentina, ainda que os sul-americanos venham de fato mordidos
para o jogo. Minha aposta nesse momento é que eles passem como primeiro do
grupo, com alguma facilidade, aliás.
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